“Arquivo dos Diários: pequenas grandes memórias”
A resposta é simples e complexa ao mesmo tempo: por um lado, acreditamos que os diários, as cartas, os desenhos, as fotografias e tudo o resto que possa construir uma memória física existem algures; por outro, sabemos bem o quão difícil é desapegarmo-nos das coisas, daqueles objectos que fizeram parte de muitas vidas. Assim nasce o Arquivo dos Diários, uma associação cultural criada em 2013 e que em 2015 apresentou oficialmente a sua estrutura e a sua missão, a de preservar memórias autobiográficas.
Em conversa com Clara Barbacini – uma das fundadoras do Arquivo dos Diários e presidente da Direcção – e Sara Aguiar – vice-presidente da Direcção da associação – percebi desde logo que o fascínio pelas memórias falavam mais alto. Tudo começou quando a família do pai de Clara encontrou as cartas que o seu bisavô enviou à mulher directamente das trincheiras da Primeira Guerra Mundial.
«Depois de pesquisarmos algumas instituições que pudessem aceitar esta doação,descobrimos o Archivio Diaristico Nazionale, em Pieve Santo Stefano. Fomos visitar o espaço e achámos muito interessante, principalmente as pessoas. Percebe-se que são pessoas que acarinham muito o projecto e todos os materiais que são entregues. Quando voltei para Portugal – já vivo aqui há 15 anos – andei a ver se havia algo do género, até porque arquivos assim já existem por toda a Europa, em França, em Espanha, na Alemanha, na Bélgica e na Finlândia. Aqui há, sim, projectos dedicados à memória, mas não há nenhuma instituição que tenha essa missão de recolher a memória popular.»
No início do projecto, foi o arquivo do Pieve que os ajudou a organizar as ideias e que lhes deu sugestões que até hoje guardam com todas as forças e agradecem ter seguido. «Uma das coisas que nos disseram logo foi para tentarmos ser independentes, para criarmos uma associação cultural sem fins lucrativos. Claro que o apoio institucional é sempre preciso e foi também por isso que encetámos esta parceria com a Junta de Freguesia de Arroios que nos dá credibilidade, mas a independência foi sempre algo que insistiram para termos.»
O principal obstáculo, admitem, é chegar às pessoas e mostrar-lhes que as suas memórias e objectos autobiográficos podem ajudar a desenvolver outros projectos interessantes, do cinema ao teatro, da ficção à investigação, ou simplesmente servir para consulta de quem procura um alento ou uma curiosidade nas histórias de outros tempos. «Por um lado provoca muito interesse, mas, por outro, surgem dúvidas.»
Para que o espólio do Arquivo dos Diários cresça e outros caminhos se abram também, lançaram o concurso “Conta-nos e Conta Connosco”, uma iniciativa gratuita que pretende chamar a atenção da população do país para participarem com os seus diários – nunca antes publicados em papel ou online. Até dia 1 de Março, qualquer pessoa pode enviar o seu diário que depois será lido por um Júri Popular, no qual todos se podem inscrever, e mais tarde por um Júri Técnico. O vencedor poderá ver o seu diário publicado por uma editora parceira do Arquivo. Já pensou em publicar memórias? Nós também não. Até agora.
Fotos gentilmente cedidas pelo Arquivo dos Diários e © Soraia Martins